sexta-feira, dezembro 31, 2004

sempre

Parece que sim, que vai ser sempre assim. Eu já tentei parar de andar, para ver se conseguia mudar qualquer coisa. Mas de qualquer forma, há sempre um motivo, há sempre um fenómeno que me leva a agir e inevitavelmente repete-se. Mesmo quando teimo em manter-me inerte, sinto um impulso. Sinto curiosidade em descobrir se afinal consegui impedir o tempo de passar e isso leva-me a destruir a minha própria tentativa de enganar o tempo. Tentei inverter o sentido, caminhei de costas, mas a repetição ocorreu, uma vez que os acontecimentos não respeitam nenhuma evolução nem ordem, apenas respeitam a sucessão. Ando nisto há anos.

terça-feira, dezembro 28, 2004

e viveram felizes para sempre

Quase escorregou na lama, de vestido branco e sapato de donzela. As pernas fraquejaram e a vista a enganou. Escondida na capa negra, fugiu do esposo e desceu a encosta do castelo até ao rio. Eram então três horas da madrugada. Deixou o príncipe entregue ao pesado sono, ao cansaço, a ressonar na poltrona em frente à lareira. A curiosidade era muita. Ao fim de todos aqueles anos, ao fim de tantas voltas e armadilhas, de tantos partos e enterros, soube que a madrasta estava a viver na aldeia do outro lado do rio. Apesar das dores intensas nas costas e do frio cortante, Branca chegou à aldeia. Empurrou com as mãos trémulas, a pesada porta de madeira de uma pequena casa e encontrou curvada na cadeira, uma velhinha cega, suja e podre. Uma lâmpada quase apagada na mesa e cascas de laranja espalhadas no chão, denunciavam pouca vida ali. No ar paira o cheiro de imundície e esquecimento. A senhora mais morta que viva com as suas roupas rotas, arrastou os olhos até os de Branca, onde permaneceu alguns segundos e deixou-os cair ao longo do corpo da visita. Pouca diferença havia nos vincos das suas rugas. Pouca beleza havia nos cabelos desgrenhados de ambas, nas ancas alargadas no tempo, no corpo ossuda e pele manchada, no olhar baço. Branca tirou a sua capa, fechou a porta, acendeu uma fogueira no fogão e cobriu com a sua capa, as costas da madrasta. Pouco ódio sobreviveu naquela sala. As duas velhas pouco disseram uma à outra, mas daí em diante e até ao fim das suas vidas, não mais se apagou o lume do fogão, não mais saíram da aldeia.

sexta-feira, dezembro 24, 2004

antes de ir

Meia hora. Não lembro de ter sido tão feliz como nesta última semana. Embora compreenda que não possas aceitar é este o momento certo para ir. Quando, na semana passada, atendi o telefone e ouvi a tua voz, fiquei tonta. Não a reconheci, claro, mas depois de desfeita a desconfiança ia caindo, com o impacto do estremecimento que senti. É difícil descrever. Não te via há 17 anos. Levei com uma tal lufada de vida que me senti como se toda a Vida tentasse entranhar-se em mim. Como se a própria existência e as memórias mais remotas e mais amachucadas, rebentassem os fechos das arcas e me preenchessem numa explosão Universal. Vi o brilho cego do nascimento dos mundos. Tinha-me esquecido de ti. Tantos anos de dias amenos, de refeições requentadas, de noites mal acompanhada. Tanta leitura vã, apagada, tantos passeios adormecidos, tantas camas desprezíveis, corpos avessos, beijos errados, sorrisos esforçados. Tantos festas frias, festas recortadas, festas festivas e nauseas festivas. Ao fim de tantos anos a marinar, percebo que me esqueci de ti. Quando desliguei desatei a chorar. Fui atender o telefone nua, com uma carta para a minha mãe, em cima do televisor e uma faca na outra mão. Estava a falar contigo e a olhar para o espectáculo montado na sala. Não acredito em sinais. Não penso que me tenhas salvo de nada. Fui feliz contigo, com a nossa casa. A nossa pensão. Os nossos bonecos feitos de meias. Com o jardim de baloiços podres e o lago sem peixes nunca limpo. Com a ferrugem nas mãos e o vestido de alças caído nos ombros. Fui feliz a jogar à bola à chuva, de vestido branco. A chorar presa à cama com varicela e a ver-vos esconderem-se no pátio e a chapinharem no lago, ou a colarem o nariz no vidro do meu quarto. A sentir as tuas mãozinhas dentro das minhas cuecas, atrás do relógio na sala, com a mãe na cozinha a remendar calças. Fui feliz a competir convosco no meu supersónico carro de rolamentos com autocolantes da Barbie e do Sport Billy. "O poder às meninas!" Dizia a tia Glória. Ficava radiante quando tínhamos na nossa rua os carroceis, em Junho e o tio dava-nos dinheiro para comprarmos algodão doce. O dinheiro chegava só para um ficha nos carros de choque. Foste meu namorado, pai, irmão, amigo.
Tive medo de não te reconhecer, mas quando vi as tuas sardas e os dentes desalinhados, voltei a ter 7 anos. Vi um menino outra vez, a única das pessoas que foste e que eu conheci. Vi-te a arrastar a mala pelo aeroporto, já a rir em direcção a mim. Parecia que trazias uns berlindes novos. No taxi não sabia o que te dizer, o que te contar, como se 17 anos tivessem sido 5 minutos e tudo o que devias saber sobre mim, já sabias. Mas eu não sou mesmo nada do que fui. Tu não me deste novidade nenhuma. Não me contaste nada. Numa semana inteira, não escapou comentário nenhum sobre aquilo que és e tens sido. Devolveste-me a minha meninice, adivinhando que eu precisava renascer. Voltámos a correr pelas Avenidas a tocar às campainhas. Caminhaste atrás de mima pregar-me rasteiras. Fomos afugentar os pombos para a praça e montar baloiços para as traseiras. Passámos dias inteiros a devorar programas chatos e a comer bolachas com doce. Levaste-me a jantar à Feira Popular, às 6 da tarde, para podermos ficar a noite toda a ver os outros rirem e a gritar de excitação. Compraste-me chupa-chupas e algodão doce. Obrigaste-me a vestir um vestido e foste de jardineira e camisa aos quadrados para o cinema. Antes de ires, pediste-me para eu ficar. Não sei como soubeste, mas não te perguntei.
A vida não passa em flashback. Na verdade não sei se no fim, os outros pensam no passado, não sei se pensam. Serei a típica suicida? Estará tudo isto descrito em algum livro? Será um lugar comum? Uma evidência? Terei um perfil traçado e a minha morte descrita cientificamente em algum manual de psicologia? Um banho de imersão, enfrascada em drogas. Terei seguido os passos estabelecidos nalgum capítulo e estará neste momento alguém a lê-los, para os despejar num exame amanhã? 32 comprimidos. Foi coincidência. Faltam talvez 5 minutos. Falta o tempo da minha vida. Falta o tempo que resta da minha vida, o mesmo tempo que decorreu se espremer estes anos todos. Cinco a viver, cinco para morrer. Posso fazer agradecimentos. Posso escolher aquilo que me leva a acabar comigo. Escolho-me a mim, não sou parva. Não foi por causa de pais ausentes nem violência, nem nenhum trauma recalcado. Estou a convencer-me disto? Assustei-me quando sangrei a primeira vez, com as mãos sujas, e as calças manchadas de tinta da china e ninguém em casa. Assustei-me quando a avó me ia apanhando com o Pedro. Assustei-me quando fui perseguida pelo estacionamento no meu vigésimo aniversário. Tive medo quando o Rodrigo me largou na auto-estrada em Leiria e quando depois me expulsou de casa. Tive medo quando apresentei a tese de mestrado, cheguei a mijar-me. Senti raiva quando o Rui me colou pastilhas no cabelo e a minha mãe cortou-o. Senti raiva quando o Alberto rasgou as minhas fotografias com o Nuno. Mesmo tendo-se passado muita coisa, porque sei que se passou, nunca amei nada com a intensidade que desejei. Nunca tive certeza de estar a viver ou a perseguir um sonho. Passei por aqui. A água já está fria.

essa puta que não nos larga

Antes aguardava, desesperado, a noite de Natal para rasgar embrulhos. Agora anseio que chegue, para esquecer o dinheiro que gastei.

quinta-feira, dezembro 16, 2004

monstro

Tenho um monstro como amante
tenho um animal a lamber-me
Podias puxar-me da cama
Podias coçar-me a nuca
Estou preguiçoso
Desaperta-me as calças
Vamos comer tremoços
deitados perto da janela
Banhados em sol
Faz-me cócegas com os dentes
Roça os teus pelos na minha orelha
Dá-me comida à boca
e... olha deixa-me! Não quero saber.

som

Continua a tocar-me o ouvido repetidamente. Nem sempre dou conta de ela ser dita. Nem se pode afirmar que é dita. É libertada. Escorre naturalmente em sucessão. A maior parte do tempo estou num limbo, na eminência de adormecer. Sinto o corpo libertar peso, pressão. Deixo de sentir o corpo e de me concentrar em qualquer coisa. Praticamente esquecido, quase a flutuar, embora por vezes para me certificar que estou seguro, volte para sentir uma qualquer parte do corpo. É nessas alturas que volta a soar tenuamente a lengalenga, a palavra escorrega vezes sem conta, docemente. Faço por esquecê-la, afasto-a concentrando-me no vazio, aconchegando-me no silêncio, focando-me, introduzindo-me num qualquer ponto de mim. Numa qualquer altura a palavra apaga-se, dissolve-se no morno deleite do limbo e com sorte dá-se a queda no sono. Até amanhã.

quarta-feira, dezembro 15, 2004

Khal Ldut

Em Khal Ldut as noites são noites. É um planeta sem luas e o fogo é um elemento indomável. Durante a noite a escuridão é soberana, plena, não há vislumbre da mínima partícula de luz. O planeta é partilhado por apenas duas espécies animais. Ambas carnívoras, ambas predadoras e presas. Privadas de olfacto, pobres de paladar e fracas de audição, têm como único recurso competitivo e apurado, a visão. Estes animais reconhecem o seu cheiro da mesma forma que uma pessoa reconheceria a folha de uma árvore à distância de cem metros. As capacidades cognitivas destas duas espécies é de tal forma ínfima, que não possuem a capacidade de distinguir pelo tacto, qualquer textura, não conseguem apurar o sabor da sua carne ou a do inimigo. Estão dotadas de uma inteligência praticamente inexistente, não sofreram qualquer evolução ao longo dos muitos milénios da sua existência. Utilizam o contacto físico na forma mais básica, como ferramenta de confronto e guerra. Ficam indiferentes aos sons e ruídos da natureza e os criados pelos adversários. Não reconhecem nem interpretam como alertas, os sinais provenientes dos mais variados sons.O paladar não tem utilidade alguma nem constitui fonte de prazer. Seriam capazes de se comer a si próprios ou os da sua espécies, se não estivesse intrínseco a sua organização em grupo. São espécies organizadas socialmente, dotadas de instinto de sobrevivência colectivo. Coexistem há milénios, caçando-se, alimentado-se, exterminando-se, extinguindo-se mutuamente. Durante o dia empreendem longas expedições de caça e intermináveis lutas pela disputa, não do poder, mas da carne que oferecem involuntariamente, arrancada dos próprios corpos, ao vencedor. Vivem da caça, vivem para a caça. A reprodução é involuntária. Não decorre de nenhum ritual, de nenhuma necessidade física, de qualquer instinto sexual ou de poder. Não se estabelece nenhum ciclo ou padrão, em qualquer das duas espécies, no que diz respeito à fecundação. Não existe acasalamento. Durante a noite, na impossibilidade de se moverem no absoluto vazio, permanecem imóveis, em grupo, em silêncio, acordados ou a dormir. Por vezes os inimigos distam-se de escassos metros, sem se confrontarem, por não se reconhecerem.
Khal Ldut é um planeta sem recursos hídricos úteis. A sua superfície é seca e rochosa. As chuvas foram raras e ocorreram duas tempestades, nos últimos 3500 anos. A vegetação é praticamente inexistente e é constituida por ervas, nas zonas mais próximas da água. Não chove há 1500 anos. Existe em todo o planeta, um pequeno lago, no hemisfério Sul. Não existem árvores de fruto. O clima é uniforme ao longo dos tempos de forma que o conceito de estações climáticas não é aplicável. O tempo divide-se unicamente, na caça e no descanso, em dias e noites, em luz e trevas.
Os Shidfea são criaturas com pouco mais de cinquenta centímetros. Têm o corpo revestido de escassos pêlos muito curtos e a pele azulada muito enrugada. A sua cabeça é pequena e achatada, como se tivesse sido espalmada, empurrada para o pescoço. Não têm lábios, têm uma língua muito curta, com as narinas largas e afastadas,horizontalmente ao nível das orelhas e sem nariz. As orelhas assemelham-se às dos gatos mas sem qualquer pêlo. Os olhos são pequenos, semicerrados e baços. Usam as duas patas inferiores para se moverem, mas para atingirem velocidades superiores, utilizam igualmente os braços. Os Dímilos são semelhantes aos Shidfea em tamanho, mas estão cobertos por pêlos longos e espessos, têm cauda e a sua lingua é mais comprida e áspera. A cabeça é redonda e têm as narinas mais pequenas e próximas uma da outra. Têm as quatro patas semelhantes, sendo quadrúpedes.
Existem três grupos sobreviventes, dois de Shidfea e um de Dímilos, em todo o planeta. Um dos grupos de Shidfea vem do Norte e é constituido por apenas dois elementos. Dos quarenta e dois animais do grupo original, existiam desde o ano passado, sete. Destes, cinco ficaram gravemente feridos, resultado da última luta com um grupo de Shidfea, acabando por morrer de fome. Os dois sobreviventes dirigem-se para Sul.
O dia nasce. Os Dímilos são atacados pelos dois Shidfea do Norte. Apesar de estarem em desvantagem numérica, os Shidfea resistem e conseguem reduzir os Dímilos a cinco elementos, antes de serem mortos. À luta sobrevive um espécime Dímilo que acaba por morrer ferido no dia seguinte. Ao fim de um mês extingue-se o grupo do Sul de Shidfea. A fome afectuou-lhes a visão e a orientação, acabando por envolverem-se numa luta confusa, fatal, entre si mesmos.
Em Khal Ldut as noites são dias. O lago seca de dia, seca de noite. O tempo divide-se apenas em luz e trevas.

memória

Estende-me a mão. Agora fecha os olhos. Concentra-te. Vamos recomeçar. Tu estás encharcado, na entrada do prédio. A iluminação na rua falhou e esporadicamente vê-se o clarão dos faróis de carros que passam. A rua está vazia. Não pára de chover. Tocaste à campaínha e pareceu-te que alguém levantou o intercomunicador sem falar. Perguntaste por ela? Não disseste nada? Porquê? Tiveste receio de alguma coisa? Ficaste à espera de uma reacção do outro lado? Quando percebeste que ninguém ia falar fizeste o quê? Então e alguém respondeu à segunda tentativa? Não compreendo. Abriram-te a porta sem verificarem de quem se tratava. Subiste as escadas ou no elevador? Sentiste algum movimento no prédio? Algum ruído? Ninguém a falar? Saíste do elevador, dirigiste-te à porta dela e estava aberta. Agora não percebo se entraste ou se voltaste atrás, porque não te decides. Viste ou não viste quem estava em casa? O que te aconteceu para não te lembrares de nada depois de veres a porta aberta? Não sentiste ninguém perto? Não ouviste passos? Não sabes como morreste?
Folhas de tela vazias, barro por moldar,
Estendidos ali à minha fente.
Os 5 horizontes giravam em volta de sua alma
Assim como a terra em torno do sol
Mas o ar que senti, o ar que respirei seguiu um novo rumo
Fui eu quem lhe ensinou tudo
E ela deu-me tudo o q vestia
E agora estas mãos desesperadas arranham as nuvens
O que aconteceu?
Todas as lembranças foram lavadas de negro, está tudo tatuado

Vou até lá fora
Rodeado por crianças que brincam
Oiço os seus risos, mas porque me sinto queimar?
Porque giram estes pensamentos crueis cá dentro?
Estou a ficar tonto, tonto
Quão rapido é o sol a cair
As minhas mãos feridas seguram os cacos do que sobrou
O que aconteceu?
Todas as lembranças foram lavadas de negro, está tudo tatuado
Todo o amor desapareceu, enegreceu o meu mundo
Tatuado tudo o q vejo, tudo o que sou e tudo o q serei

Sei que um dia terás uma vida bela, sei q serás a estrela no céu de outrém
Mas porque não, porque não, porque não podes ser no meu

Eddie Vedder "Black"

sexta-feira, dezembro 10, 2004

tua vaca

Deixa-me cortar-te a roupa.
Não quero ver-te mais armada em raínha.
O teu cheiro enjoa-me.
O teu perfume enoja-me.
Estou cansada do teu riso e das piadas repetidas, não aguento os teus jogos,
de sedução,
de ciúme,
de paz,
de guerra,
de inveja,
de poder.
Tens esquemas para tudo, exiges respostas de tudo.
Tens um corpo perfeito, um gosto desfeito.
Um brilho genuino, presença grandiosa.
Presunção merecida, felicidade oferecida.
Vejo-te caír e partir.
Faço-te chorar para meu gozo.
Nunca consegui.
Quero-te rasgar as pernas, comer-te como se fodesse uma cadela.
Por-te a gemer de raiva.
Quero trazer-te presentes odiosos.
Cozinhar-te podridão.
Amassar-te como pão.
Quero ser vaca.
Ser tua vaca.
Por-te as mamas de molho.
Por-te nervosa. Fazer-te insegura.
Criar-te em cubos. Desenhar-te em cacos.
Vou cuspir-te bosta com palavras de algodão.
Oferecer-te festas de gente destruída.
Apresentar-te um mundo em queda.
Vais pedir-me mais dor e arrojo.
Vais querer apanhar-me, mas vou escorregar.
Vais esquecer o que vales.
Tu não és o meu amor
Tu não és o meu amor
Tu não és o meu amor
Tu não és o meu amor
Tu não és o meu amor
Tu não és o meu amor
Tu não és o meu amor
Tu não és o meu amor

quinta-feira, dezembro 09, 2004

2002.02.20

O meu nome é Igor. Quando fiz quatro anos, o meu pai comprou uma fábrica de chocolates e abriu a primeira loja de doces. Aos seis anos ganhei o prémio de melhor nadador no meu colégio. Com catorze, fui vice-campeão europeu de Xadrez. Aos desassete comprei o primeiro Ferrari. Aos trinta e quatro tive o quinto filho. Aos Sessenta vendi quatro das desasseis empresas do meu Grupo. Hoje comprei um castelo.
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Chamo-me Lupi. Aos dois anos, a minha mãe morreu. Estávamos as duas sozinhas na nossa aldeia. Os outros já tinham morrido. O meu nome foi-me dado pelas Irmãs quando me recolheram. Aos doze tive os primeiros sapatos. Aos dezoito vi o primeiro automóvel. A minha prenda foi uma moldura em bambu.
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Meu nome... gostava de me chamar Henry. Os meus pais escolheram Francis, mas acho pouco masculino. Aos quinze anos fiquei sem um braço quando trabalhava na fábrica do meu tio Richard. Aos vinte e dois casei com a minha segunda namorada. O meu filho mais velho morreu de cancro o ano passado. O mais novo veio hoje ao lar e ofereceu-me um selo de 1973 para a minha colecção.

terça-feira, dezembro 07, 2004

quarto

Entre as três caixas que me deste a escolher, tirei o comprimido azul da que estava mais afastada. A primeira não escolhi porque era muito pequena e escondeste-a no guarda-fatos, em baixo das almofadas que trouxeste do teu antigo quarto. A caixa redonda era aquela da qual tu não tiravas os olhos e isso assustou-me. Entao preferi arriscar esta. Não me lembro se é minha ou tua. Se a trouxemos de alguma viagem ou se alguém nos ofereceu. Compraste isto?...Pouco importa agora. Prometo que depois de engolir o comprimido, não me esqueço mais das nossas coisas.

cheguei

Mesmo em branco. Sinto-me uma nulidade. Fica para depois.